sábado, 29 de junho de 2013

RAÍZES DA VIOLÊNCIA


Numa sociedade pautada no consumo e cada vez mais voltada para o eu (ego), com inibições éticas arrefecidas e às voltas com um Estado que prefere reprimir a educar, a violência (contra o outro) é uma válvula de escape de uma feição sombria do homem que, em condições normais, consegue ficar latente e sob controle, acentuando-se numa era de inversão brusca de valores, como a que vivemos, em que o ter conta mais do que o ser, particularmente o ser do outro... Renato Russo já havia profetizado: "Viveremos entre monstros da nossa própria criação..."

DONA RAIMUNDA


Trancada no quarto escuro, enxugando o líquido purulento que escorria pela perna doente, Dona Raimunda recordava a última visita do seu pretendente garboso. Não acreditava na conversa do povo. O viúvo Tibério acabara de visitá-la. Estivera em sua calçada, escorado na meia-porta, entabulando uma prosa agradável. Não fosse a pressa, teria aceitado o convite para um café. Logo que o eczema crônico sarasse, iria convidar o guapo viúvo para uma nova vida a dois. Com sessenta anos de idade, solteira e amufumbada, ainda nutria alguns sonhos futuros. Tibério não iria casar com a jovem vizinha enfarosa. Era só boato do povo. Ouvia toda manhã a voz dele. Confiava nas suas promessas sinceras. Somente uma parede os separava. A vizinha andava sumida ultimamente de casa. Teria casado com outro viúvo. Ficou somente o irmão caçula aletrado. Havia muita mentira no mundo.
– Eu te desconjuro, excomungada do diabo!

quarta-feira, 26 de junho de 2013

CONSTITUINTE PARA REFORMA POLÍTICA?


Cadê os juristas revolucionários? Desculpem, meus irmãos brasileiros, fomos doutrinados para sermos antirrevolucionários, temos um pacto com o atual modelo e com as atuais teorias jurídicas, não queremos sair da nossa zona de conforto. 
A Nação Brasileira perdeu a oportunidade de fazer uma real reforma política, deixando passar o bonde do movimento histórico, infelizmente com o apoio da OAB/Nacional. O Direito existe para manter o status quo. A literatura histórica demonstra que as mudanças efetivas somente ocorrem com o rompimento das estruturas. O rompimento com a estrutura e o sistema vigente somente ocorre com a instalação de um Poder Constituinte Originário. Este se manifesta em momentos de crise (não necessariamente violenta), porque instaura uma Nova Ordem Constitucional (crises jurídica, econômica, social e política). 
De acordo com a doutrina juspositivista, o poder constituinte originário é: Inicial – não existe nem poder de fato e nem de direito acima dele, iniciando toda a normatividade jurídica; Autônomo – não convive com nenhum outro poder que tenha a mesma hierarquia, só o soberano, o titular, pode dizer o seu conteúdo; Incondicionado – não se sujeita a nenhuma outra norma jurídica; Ilimitado – nenhum limite de espécie alguma, muito menos imposto pela ordem jurídica anterior. Não tem que respeitar ato jurídico perfeito, coisa julgada ou direito adquirido. 
É lógico que os atuais políticos não irão cortar a própria carne e mudar o sistema político, seria literalmente um suicídio político para a maioria dos políticos. Esta é a principal diferença. A Assembleia Nacional Constituinte seria composta por parlamentares eleitos somente para aprovar a nova ordem constitucional, ao término seria automaticamente extinta. Venceu o atual sistema. 
Veja o disse Michel Temer, jurista conceituado e um dos principais representantes de nossos políticos: "Eu acho inviável. Tenho posição definida há muitos anos a respeito disso, dizendo que a Constituinte é algo que significa o rompimento da ordem estabelecida. Seja ela exclusiva ou não exclusiva. Porque ela nunca será exclusiva, ela sempre abarcará uma porção de temas. E para a situação atual não se faz necessária uma Constituinte, ou seja, não se faz necessário romper a ordem jurídica". Fonte: Agência Brasil

Edival Braga
Procurador do Estado/RR
Professor da UFRR

segunda-feira, 24 de junho de 2013

A AGONIA DO RIO COREAÚ




O rio Coreaú é histórica e geograficamente o terceiro curso d'água mais importante do Estado do Ceará. O topônimo Coreaú, originalmente gravado como Curuayú, de curiá (pequena ave aquática) + iú (do verbo beber), significa, etimologicamente, bebedouro dos curiás. O rio nasce no município de Ibiapina, na serra da Ibiapaba, passando por Frecheirinha, Mucambo, Ubajara, Coreaú, Moraújo, Uruoca, Granja e Camocim, onde deságua no Oceano Atlântico. Fonte: Wikipédia
Nas palavras do historiador Leonardo Pildas: "Trata-se de um rio cheio de história e rico em denominações. Nasce na fazenda Poço Verde, ladeira de São Pedro, serra da Ibiapaba, próximo da cidade de Ibiapina. O trecho inicial, nas suas nascentes, recebe o nome de "rio Onça". Seu curso normal é de aproximadamente 180 km, correndo de oeste para nordeste. Após descer a serra sua trajetória segue um imenso vale de terras férteis, banhando as cidades de Coreaú, Moraújo, Granja e Camocim." (in História de Coreaú. Edição Gráfica. Fortaleza. 2003. p. 37)  
Lamentavelmente, depois de décadas de descaso e destruição, o rio Coreaú agoniza – seco e assoreado –, assemelhando-se, em alguns trechos, a um mero rastro de lixo, esgoto e degradação ambiental.  
É preciso urgentemente salvar o rio Coreaú! 
Eis um singelo poema que há algum tempo fizemos em homenagem ao rio que corre – ou melhor, corria – pela minha aldeia: Rio Coreaú.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

O BRASIL ACORDOU!



Não é de hoje que a população brasileira vem insatisfeita com o que ocorre em seu país. Corrupção, descaso com a saúde, com a educação, entre outros aspectos negativos, foram capazes de fazer grande parte dos brasileiros sair às ruas para mostrar suas insatisfações e assim lutar por seus direitos.
O motivo primordial foi o aumento das passagens em diversos Estados. E, mesmo com a redução dessas tarifas após muitos manifestos, o povo continua promovendo atos, deixando claro que o motivo não é apenas a tarifa abusiva por transportes que não oferecem melhorias.
No Rio de Janeiro foram somados mais de 300 mil manifestantes, o que faz lembrar a Passeata dos Cem Mil, uma manifestação popular de protesto contra a Ditadura Militar, em junho de 1968, na Cinelândia. Depois exatamente 45 de anos, a cena se repete, com estudantes, partidos políticos, artistas, intelectuais e outros setores da sociedade brasileira, tornando-se uma das maiores e mais expressivas manifestações populares da história brasileira.
Um pouco mais recente, em 1992, um outro movimento estudantil também se pôs nas ruas e ficou conhecido como a Passeata dos Caras-Pintadas, que teve como principal objetivo o impeachment do Presidente do Brasil Fernando Collor de Melo e sua retirada do posto.
Todas essas manifestações atingiram o resultado que buscavam: a ditadura caiu, a democracia ressurgiu e Collor foi destituído, o que parecia ser impossível. E isso tudo se deve graças aos protestos realizados, que não pararam.
Sendo assim, ou para a corrupção ou quem irá parar será o Brasil. Cabe a toda população decidir se esse momento fará ou não parte dos livros de História, em um enorme e fascinante capítulo, ou em uma frustrante nota de rodapé. Não se pode parar!

Marinara Rodrigues
3.º Ano EM – Colégio Pedro II

quinta-feira, 20 de junho de 2013

PRIMAVERA BRASILEIRA



É inegável que há uma corriola reacionária infiltrada nas manifestações sociais que varrem o País (não há, lamentavelmente, como se livrar dela por completo, em lugar algum do mundo); no entanto, querer rotular, por devoção partidária, todo o movimento com a pecha de golpismo contra a presidenta Dilma é algo que beira à desvairada loucura! Isso porque as bandeiras dos protestos são basicamente as mesmas bandeiras progressistas que as esquerdas sempre empunharam, ao menos no discurso. As manifestações são contra a imprensa manipuladora, especialmente a Globo; contra a corrupção que campeia generalizada diante dos olhos atônitos de todos, com ênfase na rejeição da PEC 37; contra um sistema político falido, que seduziu e degenerou inclusive a própria esquerda brasileira; contra as inversões de prioridades de todo gênero, a começar pela crônica falta de dinheiro para saúde e educação, ao passo que há dinheiro de sobra para três megaeventos consecutivos como a Copa das Confederações, a Copa do Mundo e as Olimpíadas do Rio-2016; contra governos de toda ordem e de todas as esferas, municipal, estadual e federal, de partidos A, B, C, D, E e Z... Enfim, o momento (para os nossos políticos e seus asseclas) é de escutar atentamente o clamor que vem das ruas e de fazer um "mea culpa" e não de promover ataques enviesados e enraivecidos contra as multidões que protestam por um País mais justo, ético e solidário. 
Muito embora os dez anos do PT no Governo Federal tenham rendido muitos avanços para o País, ainda há muito a conquistar, ainda há muito sonho dormitando na burocracia caduca das nossas repartições, ainda há muita grana nas cuecas medonhas de muitos políticos safados. É preciso lembrar que a reforma agrária, apesar dos dez anos de PT, ainda se mantém como um tabu entre nós (sequer cogitada nos últimos anos). É preciso lembrar que a camarada Dilma é a presidenta da República, mas que em sua volta há uma base aliada voraz que reúne elementos da pior escória da política nacional. É preciso lembrar que o Congresso Nacional aprovou recentemente, a duras penas, um projeto de lei conferindo autonomia financeira à Defensoria Pública, para que as pessoas mais pobres tivessem acesso à Justiça, e a presidenta Dilma vetou o projeto por inteiro, sem pestanejar, a pedido de meia dúzia de governadores de partidos políticos pouco identificados com as causas populares...
A luta das ruas, portanto, é por avanços e não por retrocessos. O momento é de o povo ir para as ruas e processar uma depuração radical que está entalada há muito tempo na garganta. Os melindres partidários e as simpatias ideológicas não podem amesquinhar o debate a ponto de reduzi-lo a uma ojeriza pura e simples pela mais expressiva demonstração democrática que este País já conseguiu produzir. É em momentos de crise que cada um verdadeiramente mostra sua face, algumas vezes surpreendentemente sincera, outras vezes terrivelmente sombria. O que for podre haverá de quebrar e quem realmente estiver do lado do povo, na luta real (porque não basta se autoproclamar popular), será preservado, mesmo alguns políticos do atual regime, mas desde que estejam entoando, na rua, de mãos dadas com o povo, o hino que será cantado no dia da vitória final.      

quarta-feira, 19 de junho de 2013

VERÁS QUE UM FILHO TEU NÃO FOGE À LUTA



Aos que cavilosa ou ingenuamente ironizam os protestos pelo país, sugerindo que a revolta também seja manifestada nas urnas, convém advertir: não se faz revolução com o voto, camarada! Revolução sempre se fez com luta, nas ruas e no campo! Movimentos sociais não têm partido, têm causa! Bó pra rua, negada! 

Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores by Geraldo Vandré on Grooveshark

segunda-feira, 17 de junho de 2013

ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA



A norma jurídica não pode ser analisada sob a lógica do mundo do ser, revestida de juízo categórico, como as regras de causalidade das ciências naturais, que obrigam de maneira incondicional. Para Hans Kelsen, a norma jurídica estrutura-se sob um juízo hipotético, pertencendo ao plano do dever-ser, haja vista que as pessoas são livres para observá-la ou não. A partir dessa premissa, Hans Kelsen entende que a norma jurídica pode ser expressa na seguinte fórmula: 

– Dada a não prestação, deve ser a sanção;
– Dado o fato temporal, deve ser a prestação.

O fato temporal é um acontecimento do mundo natural ou uma conduta humana; a prestação é uma ação humana vinculada ao dever-ser e a sanção é, grosso modo, a pena pelo descumprimento da norma. Assim, se há uma norma jurídica que proíbe dirigir veículo automotor sob influência de álcool, ao dirigirmos um carro sóbrios (fato temporal) estamos cumprindo a norma e incidindo, portanto, na prestação. No entanto, quando alguém dirige alcoolizado um veículo, estará descumprindo a norma (não prestação) e submetendo-se a uma "pena" (sanção) – multa de trânsito e até prisão, em sendo o caso –, que deve ser aplicada, muito embora nem sempre o seja, quando, v.g., a situação não é apurada pela autoridade competente.
Kelsen atribui prioridade à norma sancionadora, que denomina de norma primária, considerando a prescrição que estabelece a prestação a norma secundária. A norma primária, para o jusfilósofo austríaco, seria a autêntica norma jurídica, aquela que possibilitava o exercício da sanção do Estado, sendo a norma secundária um mero pressuposto da primária.  
Para Carlos Cossio, no entanto, a norma jurídica estrutura-se num juízo disjuntivo, expressando-se na seguinte fórmula:

– Dado o fato temporal, deve ser a prestação; ou
– Dada a não-prestação, deve ser a sanção.

Na visão de Carlos Cossio, a disjuntiva ou separa a endonorma (conduta lícita) da perinorma (conduta ilícita) e apresenta a alternativa entre as duas possibilidades, reunindo, assim, numa mesma estrutura lógica as duas proposições do dever-ser da teoria kelseniana, que finda aperfeiçoada. 
Arnaldo Vasconcelos entende que "(...) a teoria cossiana recoloca em seus devidos termos a representação da experiência jurídica, invertida prejudicialmente por Kelsen. Contempla-se, em primeiro lugar, o que realmente é prioritário: a prestação, ou o aspecto da normalidade jurídica. Depois, o que de fato é secundário: a não prestação ou ilícito, que constitui o momento excepcional da anormalidade." (in Teoria da Norma Jurídica. Malheiros. 1993. p. 87) 
A teoria de Carlos Cossio é, de fato, a que melhor explica a estrutura da norma jurídica, por ressaltar a normalidade do Direito, que é a conduta lícita – afinal, onde houver conduta em interferência intersubjetiva haverá  norma jurídica em atuação, sendo o ilícito e, mais ainda, sua apuração judicial algo esporádico –, revelando-a ainda como dever-ser, sinônimo de liberdade das pessoas para observá-la ou não.   

quinta-feira, 13 de junho de 2013

ALTOS E BAIXOS


EM ALTA

O movimento Fortaleza Apavorada, que ganhou as ruas da capital alencarina – a 13.ª cidade mais violenta do mundo! – clamando por segurança pública. Ah, se o povo soubesse que o clamor das massas é o mais assustador pesadelo daqueles que se arvoram em donos do poder!    

EM BAIXA

As exigências desvairadas da FIFA para credenciar o pessoal que vai trabalhar durante os jogos da Copa das Confederações. A ideia da FIFA não é dar aula de organização; é humilhar mesmo; é chantagear, tornando o futebol um produto para poucos, cheio de frescuras; é afrontar, descaradamente, a soberania do País.

EM ALTA

A indicação do jurista Luís Roberto Barroso para o cargo de ministro do STF. Trata-se de um admirável militante dos direitos humanos e um dos mais brilhantes constitucionalistas do Brasil. Barroso dedica o seu Curso de Direito Constitucional Contemporâneo "Aos que sonharam com a revolução que não veio. Aos que não perderam o ideal." É de arrepiar!       

EM BAIXA

A ausência de políticas públicas voltadas à revitalização do Rio Coreaú, que agoniza – seco e assoreado – num rastro de lixo, esgoto e degradação ambiental. O rio que corre pela minha aldeia não é mais belo do que o rio que corre por outras aldeias, porque o rio que corre pela minha aldeia já nem corre mais... 

segunda-feira, 10 de junho de 2013

O MANGUE É DO CUMBE



A Comunidade do Cumbe, em Aracati/CE, está em luta pela preservação do meio ambiente e contra a degradação gerada pelas fazendas de carcinicultura instaladas no ecossistema frágil de manguezais, o que tem tornado cada vez mais escassa a pesca e a cata de caranguejos, fontes básicas de subsistência da comunidade.
A luta do povo do Cumbe é pela sua própria sobrevivência na área habitada desde tempos remotos por seus ancestrais. Não se trata de um conflito qualquer pela posse particular de um pedaço de terra, mas da luta pela sobrevivência de uma comunidade inteira. Afinal, os moradores do Cumbe sobrevivem basicamente da pesca e da extração de mariscos no mangue, atividades seriamente ameaçadas pela carcinicultura.
Os danos socioambientais provocados pela carcinicultura na zona costeira cearense têm sido objeto de vários estudos acadêmicos, tendo sido alvo ainda da constante vigilância do IBAMA. No entanto, a expansão dos viveiros de camarão na área de mangue insiste em prosseguir. Assim, ciente do absurdo e com receio dos graves danos socioambientais que a atividade vem provocando, a Comunidade do Cumbe resolveu resistir, instalando uma barraca na margem do manguezal para inibir novas investidas contra o ecossistema. 
A barraca foi erguida à beira do mangue, numa área pública, caracterizada como patrimônio nacional, de uso comum especialmente dos habitantes do Cumbe, que a utilizam historicamente para suas atividades tradicionais de subsistência.
A luta do Cumbe contra a avidez e a insensibilidade das atividades empresariais que devastam, sufocam e ameaçam seu território tradicional e de uso coletivo tem encontrado aliados em várias esferas, convindo ressaltar a Carta de Solidariedade subscrita por 44 (quarenta e quatro) comunidades e organizações internacionais membros da RedManglar, bem como o apoio e a solidariedade do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), da Via Campesina (organização internacional de camponeses), da Organização Popular de Aracati (OPA) e do Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais.

domingo, 9 de junho de 2013

ESTATUTO DO NASCITURO



O aborto é um tema profundo milenarmente arraigado na literatura e alma humana, numa relação de carne, unha, amor e ódio, dentre outros fatores, em função de configurar um conflito direto entre o direito à vida e o direito de alguém que teve esse direito assegurado de dispor se o nascituro terá ou não o direito ao nascimento com vida. 
Objetivando uma melhor compreensão, veja que nascituro é o ser humano concebido, mas ainda não nascido (artigo 2.º do PL 478/2007). Penso que as duas principais razões propulsoras da conduta abortiva, ao longo dos tempos, são culturais e financeiros. Explica-se: há algumas décadas, aqui mesmo no Brasil, uma mulher ter um filho sem casar era uma desonra para toda a família. Logo, era muito comum mulheres, mesmo de famílias tradicionais, ao engravidarem de um relacionamento, terem basicamente três destinos: casar, ser trancafiada num convento de freira ou simplesmente ser expulsa de casa e ter como destino os bordeis da vida. Nesse viés, muitas das vezes, o aborto era a alternativa para evitar tais destinos. 
Vejo, em linhas gerais, após uma detida leitura ao Projeto de Lei 4878/2007, que o Estatuto do Nascituro representa um avanço das políticas públicas do Estado Brasileiro visando imprimir concretude aos preceitos constitucionais do direito à vida e da dignidade humana. Afinal, somos um Estado de Direito, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos (preâmbulo da Constituição de 1988). 
Ademais, o direito à vida é o mais importante de todos os direitos, eis que, sem ele, nenhum dos outros direitos tem importância. A inviolabilidade do direito à vida é uma garantia constitucional estampado na cabeça do artigo 5.º da Lei Política Fundamental de 1988. Acresce-se o fato de que a dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Nessa contextura, temos uma aparente colisão de, pelo menos, dois direitos fundamentais: o direito à vida versus o direito da mulher ou do Estado (eis que em algumas hipótese, no nosso ordenamento jurídico, como o estupro, o Estado autoriza o aborto) em dispor da vida do nascituro. 
Assim, tenho que, em linhas gerais, o aludido Projeto de Lei está em consonância com a Constituição Federal, mormente com arrimo no princípio da concordância prática ou da harmonização, impondo a coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito ou em concorrência, de forma a evitar o sacrifício total do direito à vida, numa hipervalorização do direito individual da mulher de dispor de seu corpo. Contudo, o Estatuto aborda temas polêmicos, como os direitos civis dos seres humanos concebidos "in vitro", os produzidos através de clonagem ou por outro meio científico e eticamente aceito, necessitando de um estudo mais aprofundado.

Edival Braga
Procurador do Estado/RR
Professor da UFRR

ACORDA BRASIL!


Primeiro eles calam o Ministério Público – PEC 37 e outras Propostas legislativas.
Depois eles calam o Judiciário – PEC 33.
O Legislativo já é calado por meio das "bases de governo".
Em seguida vão calar a imprensa, que não mais poderá se socorrer do Ministério Público nem do Judiciário. 
Atribuem exclusividade de investigação criminal, que não existe na República, ao braço armado do Executivo – as polícias –, as quais manobrarão facilmente, ante a falta de independência e autonomia.
O povo não terá em sua defesa o Ministério Público, nem o Judiciário, nem a imprensa. Do mesmo modo será com eventual oposição política.
Será o Governo da Força, dos políticos corruptos, do clientelismo, fisiologismo, das oligarquias e o povo não terá a quem pedir socorro.
Acorda Brasil!

Marcelo Cochrane
Promotor de Justiça de São Benedito/CE 

sexta-feira, 7 de junho de 2013

A APL NA HISTÓRIA



No sumário da história de Coreaú, da lavra do historiador Leonardo Pildas, publicado na página oficial da Prefeitura Municipal na internet, foram lembradas, como instituições culturais locais, a Academia Palmense de Letras (APL), a Banda de Música Lira Palmense, a Biblioteca Municipal e o Memorial Chagas Leocádio. Vide: História de Coreaú

SECA DE 1877-79



"Das grandes secas que marcaram a história cearense, uma das mais lembradas foi a de 1877-79. Foram três anos seguidos sem chuvas, sem semeaduras, sem colheitas, os rebanhos morrendo, os homens migrando para não perecer. O sertanejo havia sido pego, de certo modo, desprevenido – a última grande seca tinha ocorrido havia mais de trinta anos, em 1844-45. Até as famílias abastadas partiram em busca de refúgio junto a parentes que habitavam as serras sempre verdes ou o litoral. Os adultos iam nos cavalos, seguidos pelos carros de bois cheios de moças, crianças, mulheres e bagagens de toda sorte, tendo atrás os vaqueiros e ajudantes tocando o gado.
O pobre punha-se a pé, na poeira das longas jornadas, os adultos levando as crianças menores, puxando as vaquinhas e as cabras que restavam, o cachorro de estimação atrás. Essa massa humilde era denominada de retirantes ou flagelados. Perseguia-se ou mesmo expulsava-se estes sofredores quando acampavam nas vizinhanças de um povoado. Os habitantes temiam vê-los esgotar os 'olhos-d'águas' que ainda existiam ou saquear comércios e armazéns na ânsia de obter alimentos para saciar a fome, como rotineiramente acontecia.    
As cidades, além dos vales férteis, como o Cariri, ficaram apinhadas de flagelados. Aracati, que contava cinco mil moradores, passou a comportar mais de 60 mil. Fortaleza converteu-se na capital do desespero: de 21 mil habitantes, pelo censo de 1872, passou a 130 mil. O sertão quase esvazia. Muitos dos retirantes pereciam no caminho. Os que alcançavam os centros urbanos o faziam à beira de um colapso e impressionavam pela desnutrição.
A economia provincial, já abalada pela crise do algodão, quase que se aniquila. Escravos eram vendidos pelos donos para o sudeste. Os gados, salvo alguns conduzidos pelos fazendeiros para escaparem no Piauí, dizimaram-se pela ação das zoonoses, furtos, extravios, fome e sede. A fauna e a flora praticamente extintas. As lavouras, fenecidas. Era a natureza em plena rebelião contra o homem. O povo alimenta-se de raízes e de animais como cães, ratos e até urubus. Há casos de canibalismo. Um surto de varíola vitima milhares de pessoas. 
Mulheres se prostituem para ter o que comer. Multiplicam-se os casos de roubo e furto. Crianças seminuas são estupradas. Os senhores proprietários atribuem aqueles delitos a um desvio de ordem moral da gente mestiça, que deveria ser tratada com repressão. 
Na seca de 1877 perdera o Ceará um terço da população pela [migração] e pela morte [estimam-se em 200 mil os óbitos!]. A sua riqueza pastoril, que antes da seca calculava em 24000 contos de réis, não valia agora mais de 200 contos. A agricultura desaparecera completamente (GIRÃO, 1947:203).
Vale lembrar, contudo, que alguns setores beneficiaram-se com a seca, a exemplo das casas comerciais estrangeiras, como a Bóris Fréres, que comercializou gêneros de primeira necessidade. Empresas de navegação lucraram, também, conduzindo flagelados para o norte e sudeste, como veremos adiante. Joaquim da Cunha Freire, o Barão da Ibiapaba, lucrou com a exportação de navios cheios de cativos negros a partir de Fortaleza e Mossoró."
(Airton de Farias. História do Ceará. Armazém da Cultura. 6.ª edição. 2012. pp. 214-215) 

terça-feira, 4 de junho de 2013

A TIA QUE RECLAMOU DA SOBRINHA PROFESSORA


Era ano de tempo nebuloso da segunda metade da década de sessenta, em que recrudescera o então regime implantado com o golpe militar de 1964, numa escola primária de uma pacata e bucólica cidade do interior do Ceará, onde uma jovem professora lecionava matemática e ciências para os alunos do primário, antigo primeiro grau menor. A referida mestra tinha pelo menos um irmão que à época estudava na mesma escola em que ensinava.
Na educação, bons tempos eram aqueles, pois mensalmente havia o congraçamento de pais, mestres e alunos em uma grande, calorosa, participativa e interessante festa cívica, que sempre ocorria nas tardes do último sábado de cada mês. Era o acontecimento do dia.
Não se sabe se para dar destaque ao filho ou por superproteção, ou ainda para tentar mostrar/provar que seu filho seria o melhor da turma, e, quiçá, até de toda a escola (o que o amor de mãe não faz?!), é que, inesperada e inexplicavelmente, numa tarde de um fim de semana, eis que surge na residência da professora a sua tia, reclamando expressa facilitação (nas provas, arguição e nos trabalhos escolares) para o seu filho (primo da mestra e, por tabela, do irmão desta), sob a suposta alegação de que a professora "ajudava" o seu mano, pois morava na mesma casa e poderia "pescar/consultar" com certa facilidade o que a professora iria cobrar dos alunos quando da aplicação dos testes/exames/trabalhos escolares.
O irmão da professora, que a tudo ouvia, ficou profundamente ofendido, pois a realidade era outra, totalmente diferente do imaginado na falsa alegação de sua tia, mas não podia se manifestar, pois naquela época criança não se metia no meio da conversa de adultos. Hoje tudo é diferente, e para pior, infelizmente. Uma coisa serviu de lição deste triste e lamentável episódio: aumentou a responsabilidade do irmão da professora para manter e até melhorar ainda mais as suas boas notas, e conseguiu, causando inveja e admiração de alguns.
A sobrinha professora ficou horrorizada e perplexa, tendo prontamente retrucado e rechaçado com veemência as absurdas e levianas palavras que sua tia acabara de pronunciar, dizendo ainda que o seu irmão (que estudava com o primo) sequer perguntava qualquer coisa sobre essas duas matérias e que estudava bastante e por conta própria, e não precisava de "ajuda", vez que só tirava boas notas, inclusive em todas as matérias e não só nas dela, pois ela era clara e direta em sala de aula, só cobrava nos exames aquilo que foi dado/ministrado em sala de aula. Nada fora disso. E, ainda, os exames eram guardados na escola. E, mesmo que seu irmão precisasse de nota, jamais faria esse absurdo imaginado e dito pela tia. A sobrinha disse a sua tia que ficou bastante decepcionada e que jamais imaginaria tal atitude da parte dela. A tia ficou tão envergonhada da besteira que fez que antes de ir embora pediu desculpas e perdão à sobrinha, e ficou um longo tempo sem fazer uma nova visita.
O irmão da professora disse: – Mana, a nossa tia não sabe o que diz.
Nesse mesmo ano, o irmão invejado e admirado da professora tirou na maioria dos (08) oito meses daquele ano letivo o primeiro lugar geral da escola – as melhores e maiores notas, inclusive por bom comportamento – e recebia naquelas tardes festivas presentes e homenagens.
Hoje em dia, ambos (primo e irmão da professora) são cidadãos bem sucedidos em suas atividades profissionais que abraçaram. Quanto à professora, já aposentada, é uma ótima e dedicada profissional da área jurídica. A tia é uma tranquila senhora octogenária.

Boa Vista/RR, 03/06/2013.

COSMO CARVALHO
Engenheiro e Advogado

segunda-feira, 3 de junho de 2013

UMA RELÍQUIA COREAUENSE



Palma Esporte Clube – Campeão Invicto da II Copa Zona Norte (1986). 

SAUDADE



Saudade é algo que marca;
É algo que fica e que depois passa,
Mas que a qualquer momento pode voltar.
Saudade não mata, apenas maltrata;
Ora alegra, ora entristece,
Quem já não teve saudade de algo?
Ah! como é bom lembrar de algo;
Lembrar de uma coisa, de um detalhe;
De atitudes ou de alguém, lá do passado;
Ou mesmo do presente.
Saudade é traço do amor;
Quem não tem e nem teve saudades
Não sabe realmente o que é amar.

Jarbas Menezes 
Advogado e Fiscal da Sefaz/RR

domingo, 2 de junho de 2013

OFÍCIO PRECOCE


Não recordo precisamente quando me iniciei no ofício. Num inverno promissor de meados dos anos 80, suponho. Dedé não deu conta de um dos cambos de curimatã. Deram-lhe as contas na primeira venda. Prossegui solitário vendendo peixes pelas ruas calmas da Palma pelos longos anos seguintes. A meninada, mesmo necessitada, considerava indigno o ofício de vender peixe. À época, peixe era comida de pobre.
A timidez e a falta de vocação não me permitiram aprimorar ao longo do tempo técnica comercial alguma. Caminhando cabisbaixo pelas calçadas, com os peixes fustigando as pernas, oferecia-os nas portas dos  poucos fregueses mais frequentes.
– Quer comprar peixe?
Geralmente a resposta era o silêncio. Um ou outro dava uma espiada, perguntava a origem do peixe, pedia desconto, reclamava do cheiro forte, quase sempre numa mera curiosidade maçante; ao final, recusava a oferta. Eu escutava resignado os praguejos irritantes do sapateiro Cordeiro, aguardava paciente a escolha demorada de Dona Evani e de Dona Fransquinha, depois dobrava o dinheiro e o guardava no cós do calção surrado e voltava para casa saltitante, sem atinar na relevância do apurado do dia para a debilitada economia familiar.
(...)    

LIVRE? ARBÍTRIO!



Então disse Deus: "Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança. Domine ele sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os grandes animais de toda a terra e sobre todos os pequenos animais que se movem rente ao chão".
Criou Deus o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou.
Deus os abençoou e lhes disse: "Sejam férteis e multipliquem-se! Encham e subjuguem a terra! Dominem sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se movem pela terra".
Disse Deus: "Eis que dou a vocês todas as plantas que nascem em toda a terra e produzem sementes, e todas as árvores que dão frutos com sementes. Elas servirão de alimento para vocês.
E dou todos os vegetais como alimento a tudo o que tem em si fôlego de vida: a todos os grandes animais da terra, a todas as aves do céu e a todas as criaturas que se movem rente ao chão". E assim foi.
E Deus viu tudo o que havia feito, e tudo havia ficado muito bom. Passaram-se a tarde e a manhã; esse foi o sexto dia. Gênesis (1-26,31)
Pois bem: Estaria aí nas escrituras sagradas o grande bug da criação?
Não acho que Deus criou o homem para praticar tudo isso aí escrito, mas, se alguém escreveu dizendo que fora o Criador autor de tais heresias, a humanidade acreditou em cheio, e o que vemos ao longo dos milênios é a prática desmedida de tudo isso.
No modesto entender deste escriba-mor sucupirano, Deus criou o espírito do homem à Sua semelhança e lhe deu um envólucro carnal para se aperfeiçoar nas lutas terrenas. Aperfeiçoamento este proporcional ao bem praticado. Mas o que vemos?
O homem a caminhar como que regredindo aos tempos da barbárie, apesar do progresso intelectual... Ele, homem, levou mais que ao pé da letra o significado das palavras "domínio" e "subjugar", ao ponto de, movido por cupidez, ganância, ambição e tantas outras qualidades más, ter, ao longo dos milênios que deveriam ser de paz, harmonia e evolução, milênios de irrigação da terra bendita com o sangue inocente dos irmãos desvalidos...
Começou atirando pedras e paus... Com a descoberta da pólvora, que seria a matéria-prima unicamente para os espetáculos de cores dos fogos de artifício, a maldade humana descobriu que ela poderia impulsionar projéteis mais letais que pedras e paus. E a matança que era secular, mas artesanal, se intensificou quase que semelhante a uma linha de montagem. Triste caminhar da humanidade. O livre arbítrio que o homem filho de Deus recebera do Pai e Criador rumara para os tristes mananciais sangrentos das lutas injustificadas cuja história está aí para contar.
Poucos avanços houve de lá para cá... Algumas convenções sobre direitos humanos, pensadas após o advento da Revolução Francesa, não foram suficiente para acalmar os ânimos egoístas e malignos...
Mas não dar mais para esperar! É preciso urgentemente clamarmos em uma só voz e em todos os idiomas conhecidos e falados pelo homem ao redor do planeta:
– Parem a matança!!! Parem!!!
Para isso, que tal começarmos fazer circular mundo a fora um S.O.S clamando pela contenção da fabricação de armas de fogo? Se parássemos a fabricação de projéteis em geral hoje, em um mês o estoque ficaria zero, e por ter perdido a prática de brigar com pedras e paus, quem sabe a humanidade não se daria as mãos e num grande abraço fraterno diriam em uníssono:
– Meu irmão! Vamos nos proteger de nós mesmos?

Tenho dito... E sempre!!!

Manuel de Jesus da Silva
Presidente da Academia Palmense de Letras  APL